domingo, 21 de dezembro de 2008

Tango

She strips the strings of the violin. With no sorrow. With no fear. A hand that can’t melt
each sound, each man. That attracts and moves away with a single note. A desire that grows above herself. A tear, a smile, an eye, a glove and an old shoe. Loneliness in all objects. The closed window and just a dream of a love in her mind. And they dance …because the bandoneón still screams outside in the rain of Montevideo.

sexta-feira, 19 de dezembro de 2008

Sem Titulo II

Passa pelo primeiro vizinho e um boa noite sai por entre os dentes, passa o cão que corre ofegante, desce a rua, o ar frio parado corta-lhe os pulmões. Os olhos vítreos por entre o ar, as pessoas que seguem à sua frente. Os carros que passam seriam... mas o sinal passa a vermelho. O pedinte podia... mas adormecido pouco pode. A casa vermelha, mais uma montra. Aquela loja que não visitou. A música que continua ainda na sua cabeça, os versos perdidos, a melodia que não para, e repete, repete. Um táxi. O peito ainda lhe dói, só não sabe porquê. A ira que lhe corre no sangue e que faz com que o seu coração bata fora do peito, no frio do ar que corta. Enfim chega. Quero um desses. Pode ficar com o troco. O casaco deixa passar para fora o frio que sente dentro de si. Um homem que a segue, talvez seja este... mas muda de lado, depois de rua, perde-se. Sobe a rua, abre a porta e sobe as escadas sem acender a luz. Entra e um cigarro pouco a pouco queima-lhe o peito, o desgosto, a ansiedade, a solidão, a traição não cumprida, o abandono de si mesma...

Sem Titulo

Ela queria ser amada, ainda.
De modo diferente, olhada, acarinhada, começar de novo, escrever cartas de amor, breves mensagens, talvez.
Alguém que a desejasse porque não a poderia ter, logo.
Alguém que a protegesse porque a não podia magoar. Alguém que a sonhasse por ela mesma, pelos sonhos que ela não conseguia, já.
Imaginar a sua voz, longe.
O toque de uma pele que não conseguia, por breves instantes. O beijo de uns lábios novos no seu corpo, raso.
Perder-se numa solidão que não sabia que sentia. Habituara-se a estar sempre acompanhada sem tempo para perceber que estava mais só, ainda.
Uma voz que não lhe gritasse, que não a magoasse, que não a desejasse, que não a ansiasse, mais.
Um olhar, do outro lado, que ela só queria que a visse, primeiro.
... mas perdeu-se, e voltou onde estava, igual.
Nem ele a percebeu, perdida.

GUCCI



Nem triste, nem contente aquele homem continuava com um sorriso interior porque agora estava consciente de que tinha um limite. Sabia qual o seu prazo final e só tinha que decidir como queria estar até lá. Saber que se destrói por dentro, que nada o pode impedir de chegar lá mais depressa, dava-lhe uma sabedoria de vida igual à dos velhos, porque também eles sabem do seu fim próximo. Sorri como nunca à mulher que passa por ele. Agradece com vontade à jovem que vende guloseimas. Telefona a um amigo porque sim. Escreve um poema à janela da sala. Com riscos, traços, espirais, sonhos, ternura, mas nunca ódio ou raiva. Um poema vivo de vida, que grita sorrisos e chama por outros que não terão tempo. E continua a sonhar com um amor que conhecerá por breves momentos.

sábado, 6 de dezembro de 2008

Miracle

Redesenhava a cidade a cada nova direcção que tomava. Perdido durante a manhã. Subia ruas, atravessava praças, entrava em igrejas abertas e saía de livrarias com livros por comprar. As pessoas cruzavam-se com ele. Umas conhecidas, outras que o cumprimentam, algumas que passam e só uma o quis conhecer.
Seguiu-o, desejou-o e desejou que ele olhasse para trás.
No fim da rua, o sinal verde fá-lo precipitar-se. Mas o desejo atraio e grita-lhe. Olha para trás e os seus olhos cruzam-se com os olhos que o chamam. As pessoas continuam a andar, passos rápidos, malas que chocam, chávenas de café, ela pára, empregados que gritam, carros que avançam, ele sorri-lhe, buzinas, crianças que choram, estátuas que os olham, portas que se abrem, ela assusta-se, pessoas a entrar, pombos a voar, assustados, rápidos, um eléctrico que avança, ele não recua, o sinal encarnado, ela corada, com medo, ele embevecido, sem parar, o eléctrico que apita, um estrondo na cabeça, um grito de mulher, as pessoas rápidas, malas, sacos, sapatos, casacos, pés, uma sineta, que não pára, que não pára, e apita, ela corre, ele recua e ainda se olham pela primeira vez.

Soir de Lune

De todas as cartas queimadas, os gritos, as mensagens que tentara enviar pelo irmão mais novo, só sobrou uma mecha de cabelo dele. Uma dor no peito que a agonia, as lágrimas que deixaram de correr há tanto tempo. Ainda fechada naquele quarto. Quando, em Maio, o pai descobriu que Helena andava de namoro com um jovem alferes, arrastou-a pelos cabelos desde o café onde se encontravam e fechou-a no quarto interior. Os olhos do irmão mais novo tentaram, sem forças, salvá-la, devolvê-la àquele estado de pureza em que ele a conhecia. Mas não houve súplicas que a libertassem: nem os apelos da mãe, nem os olhares reprovadores do padre, que não sabia, porque estes assuntos são resolvidos dentro de casa. Ficou, esperou e lutou com a única força que tinha, deixar-se morrer, sem que pudesse ver a luz do dia ou sentir a aragem com cheiro a mar que aquecia as noites.
Foi numa dessas noites de Dezembro, em que o frio e o mar se unem num só calor, que Helena o viu e foi beijada por ele. Um único e primeiro beijo, um único beijo que selou a sua vida para sempre. Escondida de todos, e enquanto o irmão mais novo brincava, deixava-se amar pelo alferes loiro. Um amor como o daquele filme que tinha visto, às escondidas, porque não podia deixar as aulas de piano, nem as orações. Um sorriso desencontrado, uma carta breve, uma azeda na janela.
Aquele jovem loiro que a deixou abandonada, aquele pai que a ouvia tossir e a ignorava, aquela mãe que a abraçava com o olhar e o irmão mais novo. Saiu por fim, libertada daquele quarto, numa manhã de Dezembro. Numa manhã igual a uma outra manhã. Procurou com os olhos mortos, os olhos que a devolvessem à vida e só encontrou os olhos do irmão mais novo, ácidos, enraivecidos contra um pai que lhe tirou a irmã com quem aprendera a amar.